Mais um retrato sem retoques de Photoshop do desmonte da indústria brasileira acaba de vir à tona. Os números do pente fino do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) falam por si. Em três anos seguidos de economia em estado vegetativo, o PIB derreteu perto de 8% e a produção industrial desabou 17% no plano geral. De 33 setores nos quais o Iedi passou o rodo, oito caíram de 50% a 66% entre 2014 e 2016 e 25 recuaram entre 25% e 46%. O plástico está entre as primeiras vítimas do efeito dominó desse desastre, dada sua presença tanto nas obras de infraestrutura como no consumo das famílias. À primeira vista, o cancelamento de um punhado de outros eventos industriais pelo país adentro e a continuidade da crise recomendariam a transposição da Feiplastic para dias melhores. Mas José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), entidade responsável pela feira, derruba esta postura conformista pensando fora do quadrado. Como salienta nesta entrevista, o momento é agora para o setor ir às compras na Feiplastic, para não perder o pé quando a maré subir. Além do mais, uma frase de Irineu Szpigel, presidente da Engratech e veterano sócio da Abiplast, até hoje não perdeu a validade: “nunca perdi dinheiro por contrariar o bom senso e comprar máquina quando a economia engasga”.
PR – Qual a mensagem embutida na realização da Feiplastic 2017 num momento em que os setores industriais, exceto o agronegócio, penam há três anos com alta inadimplência, ociosidade e desemprego?
Roriz – As crises acontecem e esta, apesar de perdurar mais que as outras, não foi a primeira nem será, provavelmente, a última. O que precisamos lembrar é que crises também geram oportunidades, mesmo que sejam aquelas oportunidades de se investir em inovação de processo com o intuito de estar preparado para a hora da retomada. Em momentos como este, é importante que as empresas estejam numa espera ativa, ou seja, continuando a investir para reduzir custos, aumentar a produtividade e contar com competitividade para quando houver a a virada dos negócios. Tendo isso em vista, uma feira bienal demonstra que as empresas estão preocupadas em fazer a lição de casa. Portanto, assim que se instaure um ambiente econômico e político propício para voltar a crescer numa conjuntura estável, a indústria estará preparada.
PR – Apesar dos pesares, o Brasil continua no radar das matérias-primas, máquinas e transformadores internacionais. Como explica essa permanência?
Roriz – O setor de transformados plásticos é relevante no mundo inteiro. Nos Estados Unidos, é a segunda maior indústria manufatureira em relação a empregos, valor adicionado e salários. Já na União Europeia é a quarta, considerando a performance setorial (empregos/valor adicionado).No Brasil, não é diferente. Nosso setor é o quarto empregador da indústria de transformação em geral e o sexto em termos de valor adicionado. Além disso, a indústria plástica atende setores bastante significativos para a economia, como a construção civil, alimentos e bebidas e agricultura, apresentando sempre novas aplicações geradoras de benefícios para os consumidores finais num país possuidor de um dos maiores mercados e parques industriais do mundo. Por isso tudo ela continua no radar internacional.
PR – No plano geral, os fabricantes de máquinas nacionais ausentaram-se da Feiplastic em prol da feira Plástico Brasil, promovida pela Abimaq. Como isso afeta a histórica relação de parceria entre a Abiplast e a Câmara Setorial da Indústria de Máquinas para Plástico (vinculada à Abimaq)?
Roriz – As estratégias de atuação de outras associações são legítimas. Se a Abimaq entendeu que a parceria que existia não era mais interessante à sua representação setorial, não há o que possamos comentar, pois, como disse no início, a estratégia individual de cada entidade de classe cabe somente a seus dirigentes. Entretanto, vale atentar para as mudanças que o sistema produtivo tem sofrido, em relação às novas modalidades de negócios e investimentos, observadas aqui e pelo mundo afora. Em decorrência, elas estão alterando o formato de atuação da Feiplastic. As soluções para as indústrias não estão mais baseadas apenas em matérias-primas e máquinas e equipamentos, mas em automação, robótica, softwares, outras tecnologias de processo e até de serviços. Visa-se uma produção mais integrada, com áreas cada vez mais interligadas e eficientes. O empresariado está recuando os investimentos em capacidade produtiva e, por tabela, em máquinas básicas e equipamentos auxiliares. Passa a direcionar suas intenções para ferramentas que possibilitem essa integração, como novos moldes, tecnologia da informação e instrumentos de gestão. Prova disso, aliás, é o cada vez mais disseminado conceito da Indústria 4.0, visando não somente mudanças pontuais dentro de cada empresa, mas uma transformação no processo.
PR – Mesmo tendo como sócios fundadores duas petroquímicas, Braskem e Dow, e 12 transformadores e um reciclador/distribuidor como associados, a Plastivida, sem qualquer elo com a Abimaq, decidiu expor na feira Plástico Brasil, além da sua presença tradicional na Feiplastic.Como a Abiplast viu isso?
Roriz – A Plastivida é um instituto ligado à Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim); representa a segunda geração do plástico (N.R.- na realidade, representa apenas o setor de poliolefinas. PVC, PET, PS e plásticos de engenharia estão fora do bojo da Plastivida). Reitero que a estratégia de ação de cada entidade cabe somente a ela. As empresas da segunda geração estarão expondo na Feiplastic 2017 e a presença ou não das entidades de classe que as representam é uma estratégia institucional de cada uma. Desde 2011, a participação da Plastivida nas nossas feiras (a extinta Brasilplast e Feiplastic 2015), se dava através da Operação Reciclar, realizada sob sua organização. No entanto, a partir deste ano, a curadoria passa para Abiplast, que é a representante dos transformadores e recicladores de materiais plásticos. Nada mais natural, portanto, que este evento ocorra sob a nossa tutela. No entanto, assim como a Abiplast participou da montagem das edições passadas da Operação Reciclar, as portas estão abertas a qualquer outra instituição interessada em somar esforços ao projeto.
PR – Numa feira do plástico, divulgar os benefícios da reciclagem (iniciativa Operação Reciclar) equivale a rezar o padre nosso para o vigário; não é novidade alguma para quem milita no setor. Não seria mais lógico e proveitoso propagar informações e iniciativas sustentáveis desse tipo em eventos de indústrias finais, como a Fispal e o Salão do Automóvel?
Roriz – A Operação Reciclar atua de duas diferentes maneiras. Numa parte da exposição, existe uma linha de reciclagem em funcionamento, com exposição de máquinas, entre elas equipamentos expostos até pelos associados da Abimaq, para que os próprios recicladores possam conhecer essas tecnologias. A outra frente da Operação atua de modo mais institucional, buscando integrar a reciclagem ao consumidor final, apresentando produtos elaborados com material recuperado, tidos como artigos de alta tecnologia e que não são de conhecimento geral. Neste espaço, tanto os clientes de setores ligados a Fispal quanto os do Salão do Automóvel, estarão presentes na Operação Reciclar 2017. Também estamos buscando levar o consumidor final ao evento deste ano, através de futuros formadores de opinião, como os alunos de escolas técnicas com visitas guiadas.
PR – A Abiplast considera aceitáveis ou não as despesas de internação e alíquotas de importação de máquinas como as expostas na Feiplastic, assim como a oferta de crédito no Brasil para financiar a aquisição delas?
Roriz – A Abiplast sempre defendeu – e assim continua – que o acesso às matérias-primas e máquinas seja viabilizado de forma competitiva. Daremos sempre a preferência a produtos fabricados no Brasil, mas somos contra barreiras tarifárias que impeçam a aquisição de equipamentos e insumos que melhorem a competitividade e produtividade da indústria de transformação, como é o caso dos moldes para injeção que estão na Lista de Exceção Tarifária (LETEC) desde 2011 com alíquota de 30% para sua importação. Apesar das barreiras tarifárias existentes, sabemos que o transformador está sempre atento às novas tecnologias e há importação de máquinas e equipamentos em função da estratégia de competitividade de cada empresa. Tendo isso em vista, a oferta de crédito externa, viabilizada pelos fabricantes estrangeiros de insumos, é muito mais interessante quando comparada às oferecidas pelos bancos comerciais brasileiros. O país precisa de linhas de investimentos mais atraentes às empresas nacionais para promover a retomada econômica, e sabendo disso, a Abiplast viu com bastante pesar o fim de programas setoriais como o Proplástico/BNDES, apontando para uma atuação diferente daquela que o empresariado brasileiro necessita.
PR – Em seu terceiro ano de recessão, o Brasil é o único país do mundo com duas feiras nacionais de plástico bienais e quase simultâneas. Essa situação se sustenta, do ponto de vista de rentabilidade do evento e da representatividade do setor plástico como um todo? Vai ser assim também em 2019?
Roriz – A Feiplastic é organizada pela Reed Exhibition Alcântara Machado e a Abiplast, como representação da indústria de transformados plásticos e recicladores, apenas visa disponibilizar aos seus associados a melhor feira do setor. Nosso foco não está na visão sobre a rentabilidade do negócio; não somos realizadores de feiras para gerar caixa para a nossa associação. Atuamos com foco no aumento da competitividade e sustentabilidade das empresas associadas e do setor como um todo. Em termos de representatividade, a Feiplastic, uma evolução da Brasilplast, está há 30 anos no mercado. Mesmo que tenha sofrido algumas mudanças a partir de 2011, quando seu nome foi alterado, ela é a feira oficial do setor de transformação e reciclagem de materiais plásticos. Desse modo, ela mantém sua importância mesmo com a existência de outras exposições. Quanto a 2019, só o tempo dirá.
Fonte: Plásticos em Revista